“Não sois máquinas, homens é que sois…”

Fonte: Pulsar

É com essa indelével frase de Charles Chaplin que vou começar a discorrer sobre o Dia Mundial de Combate às Lesões por Esforços Repetitivos (LER) e Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (Dort). Hoje, 28 de fevereiro, é a data escolhida pela Organização Internacional do Trabalho (OIT),  agência multilateral da Organização das Nações Unidas (ONU), especializada nas questões do trabalho, para chamar a atenção para esses distúrbios que têm relação direta com o trabalho e que atingem milhões de trabalhadores.

Mas, você sabe o que é LER/Dort?

Para entendermos melhor, é preciso esclarecer que em relação ao trabalho propriamente dito, quando algumas precauções não são tomadas, alguns distúrbios podem aparecer, como a LER (Lesões por Esforços Repetitivos), que está inclusa em um grupo de Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (Dort). Apesar de ser menos conhecido do que a LER, o termo Dort foi introduzido para substituí-la, pois existem outros tipos de sobrecarga no trabalho que podem ser prejudiciais, como excesso de força, vibração constante de algum objeto de trabalho e as posturas inadequadas para a execução das tarefas, que também são nocivas ao trabalhador.

Fonte: Suzanclin

Dentre alguns distúrbios mais frequentes estão as tendinites (principalmente na região do ombro, cotovelo e punho), as lombalgias (dores na região lombar) e as mialgias (dores musculares em vários locais do corpo), podendo afetar pessoas de diferentes idades e passíveis de acometê-las em qualquer tipo de trabalho que seja executado de forma inadequada ou que não respeite os limites do corpo. A constituição física também é um fator de risco, precisando ser investigados cuidadosamente, uma vez que podem ser resultado de condições relacionadas ao trabalho somadas às condições extra laborais.

Apesar dos sinais de LER serem identificados desde a Antiguidade, foi a partir da Segunda Revolução Industrial, em 1850, ocasião em que os trabalhadores começaram a adquirir importância socioeconômica, que seu “adoecimento” começou a ser objeto de estudo por parte da ciência, proliferando-se assim, descrições de trabalhadores com casos de LER/Dort.

Neste contexto, o filme Tempos Modernos (1936) retrata extraordinariamente a condição do homem naquele período, como uma peça dentro de um mecanismo industrial, em que Carlitos, o personagem de Charles Chaplin, passa longas horas desempenhando uma mesma tarefa na linha de produção e mostrando que a não adaptabilidade ao ritmo da esteira, simboliza a submissão do homem ao ritmo imposto pela máquina. Ao mesmo tempo, no momento em que ele sai do ambiente de trabalho, reproduzindo o mesmo movimento realizado na esteira fabril, mostra como a especialização do trabalho impõe uma repetição que anula completamente o significado do trabalho em sua vida. Em outros termos, o homem se transforma em uma mera extensão da máquina.

Fonte: Viewpoint Magazine

Mesmo sendo bastante cômicas as situações encenadas no filme, podemos ver que a sátira está atrelada a uma forte e consciente mensagem que desafiou a lógica do trabalho industrial, expondo que, dentre diversos problemas que o desenvolvimento capitalista e seu processo de industrialização trouxeram à classe trabalhadora, evidenciou-se a prevalência cada vez maior das LER/Dort, acometendo trabalhadores de diversos setores em todo o mundo onde, segundo o Ministério Público do Trabalho, registros de epidemias foram constatados na Inglaterra, países escandinavos, Japão, Estados Unidos, Austrália e Brasil. Conscientizar trabalhadores sobre a importância da prevenção, diagnóstico e tratamento é o remédio mais eficiente para minimizar essa “doença” profissional, de forma que, desde 2000, o último dia do mês de fevereiro é lembrado em vários países como o Dia Internacional de Conscientização sobre as LER/Dort.

Considerando que esses distúrbios pode atingir qualquer pessoa que execute determinado movimento repetidamente, como limpar a casa, carregar peso, tricotar, jogar videogame e, em voga, a digitação intensa que vem, atualmente, contribuindo para o aumento do número de casos de doenças ocupacionais, é interessante sabermos que dentre os principais sintomas de LER/Dort estão:

  • Dor localizada, especialmente nos membros superiores e dedos;
  • Dificuldade de movimentação;
  • Fraqueza, cansaço, peso, dormência, formigamento, sensação de diminuição, perda ou aumento de temperatura e sensibilidade;
  • Redução na amplitude do movimento;
  • Dificuldades para o uso dos membros, particularmente das mãos e, mais raramente, sinais flogísticos e áreas de hipotrofia ou atrofia.

De acordo com a Escola Paulista de Medicina, esses sintomas podem ser exacerbados ao realizar determinados movimentos, mas também é importante observar quanto tempo duram, quais atividades o agravam, qual a sua intensidade e se há sinais de melhora com o repouso, nos feriados, fins de semana, férias, ou não. Normalmente os sintomas iniciam de forma leve e pioram apenas nos momentos de pico de produção, no final do dia, ou no final da semana, mas se o tratamento não for iniciado e se não forem tomadas medidas de prevenção, existe uma piora do quadro e os sintomas se tornam mais intensos e a atividade profissional fica prejudicada.

Fonte: Freepik

Vale ressaltar que a demora em tratar do problema pode trazer um problema ainda maior, exigindo, em alguns casos, fisioterapia, intervenção cirúrgica ou, até mesmo, a troca do posto de trabalho pode ser uma opção para que a cura seja alcançada. Na fisioterapia, algumas orientações para o dia a dia envolvem opções de alongamentos, movimentos que devem ser evitados e o que se pode fazer em casa para se sentir melhor. Inclusive, uma boa estratégia caseira é colocar uma compressa de gelo sobre a articulação dolorida, deixando atuar por 15 a 20 minutos.

O tratamento em caso de LER/Dort é demorado, havendo períodos de grande melhora ou de estagnação, e por isso é preciso ter paciência e cuidar da saúde mental durante esse período para evitar o quadro depressivo, de modo que atividades ao ar livre como caminhada e corrida, exercícios como Pilates e hidroginástica são as opções mais recomendadas. Entretanto, o combate à LER/Dort é uma via de mão dupla, pois além dos ajustes no ambiente e da adoção de medidas preventivas como equipamentos adequados ergonomicamente por parte da empresa, as ações individuais também fazem a diferença. Como exemplo de cuidados, a fisioterapeuta Ana Fraga, professora do curso de Fisioterapia da Estácio, sugere boas práticas como:

  • Pausar as tarefas e fazer alongamentos nos períodos que não prejudiquem sua produção;
  • Trocar de tarefas ao longo do dia, evitando assim os esforços repetitivos;
  • Fazer pausas de 15 a 20 minutos a cada três horas, a fim de poupar os músculos e tendões;
  • Ingerir líquidos para que todas as estruturas corporais sejam bem hidratadas, o que diminui o risco de lesões.

Além desses cuidados, a Escola Paulista de Medicina recomenda manter sempre uma postura apropriada durante o horário de trabalho, com as costas eretas e bem apoiadas no encosto da cadeira, respeitar os limites do corpo, utilizar apoios ergonômicos para os punhos e pés durante a utilização do computador, manter o monitor na altura dos olhos para não ter que forçar o pescoço para baixo, utilizar cintas e outros acessórios de proteção fornecidos pela empresa ao executar tarefas que exigem força física, praticar exercícios físicos regularmente e manter um estilo de vida saudável.

Fonte: CIEE/PR

Assim, como forma de prevenção e contribuição para a qualidade de vida no ambiente de trabalho, a instituição aponta que a ginástica laboral também deve (ou deveria) ser executada no próprio local de trabalho, tendo como principais objetivos a prevenção das LER/Dort, a diminuição do estresse, dores musculares, fadiga, tensão muscular, aumento da consciência corporal, melhora do condicionamento físico, flexibilidade, coordenação e resistência, atuando de forma preventiva e terapêutica.

Diante do exposto, a falta de informação, tanto do empregador como do trabalhador, ainda é um forte obstáculo contra a prevenção das LER/Dort. Se de um lado, temos a falta de investimento em melhores condições de trabalho e do outro, o medo de perder o emprego, muitas vezes ocultando a dor até chegar à incapacidade laboral, precisamos ter em mente que, acima de tudo, não somos máquinas, mas pessoas “de carne e osso”. Como vivemos numa sociedade que busca evoluir de modo mais eficiente e produtivo, é fundamental “blindar” o nosso corpo e a nossa mente acerca dos processos mecânicos e repetitivos onde, vira e mexe, acabamos trabalhando como complemento de uma máquina. Vale a pena refletirmos sobre essa questão pois, como já comentei anteriormente, prevenir ainda é melhor do que remediar!!!

~ Bia ~

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